domingo, outubro 25, 2009

Carta à minha Mãe

Aldeia de João Pires, 25 de Outubro de 2009
 
Querida e saudosa Mãe.
Estimo que esta minha carta a encontre na Felicidade eterna, na companhia do meu Pai, dos Avós e tios e restante Família, junto da Santíssima Trindade e de Nossa Senhora.
Querida Mãe, faz hoje 19 anos que nos deixou e, desde essa data, isto nunca mais foi a mesma coisa. Ao princípio, a saudade era tão intensa que quase me endoidecia e apanhei-me muitas vezes a falar consigo. Embora soubesse que me ouvia, nunca consegui receber a sua resposta.
Depois, diziam-me, "o tempo cura tudo". Na verdade cura e não cura. A conformação com a sua ausência foi dando lugar àquilo que eu vivia e era quase um desespero. Além do mais, ficámos com o meu Pai, que já está agora junto de si, sobrou-me trabalho, casaram os meus filhos e nasceram os netos, sim os meus!!! - "filhos criados, trabalhos dobrados" e eu acrescento filhos casados trabalhos quadriplicados - Olhe, Mãe, isto cá na Terra está uma grande complicação, uma "sem-vergonhice" que muito a faria sofrer. Mas voltemos à nossa Família: os seus netos já me fizeram avô. O meu Pai ainda foi bisavô, mas ele já lhe deve ter contado, "O Avô Pim-Pim", como lhe chamava a vossa bisneta mais velha, a Dulce. A mais pequenina, a Leonor, está a chegar, dentro de dias, a que vai ser a primeira filha do seu neto mais novo, pois, o João Pedro. Neto mais novo, claro, não contando com a Cristina, a filha mais nova da minha Irmã, que nasceu três dias antes da sua partida e fez agora também 19 anos. Pois, "Deus tira com uma mão e dá com a outra"... Porque não havíamos de ter as duas ao mesmo tempo? A nós Ele não explicou, mas, com certeza, a Mãe já sabe...
Desde que a Mãe partiu, isto dos seus filhos nunca mais foi a mesma coisa. Como os pintainhos a quem roubassem a galinha, ou ovelhas tresmalhadas, sem pastor, nunca mais fizemos festa lá na Aldeia. E também tivemos outras falhas. Ah! Mãe, quanta falta nos faz cá em baixo. Pensava eu que, quando fosse velho, já sabia de tudo e que não precisaria de si para nada. Pois não é agora que estou a chegar à idade com que se despediu de nós que ando a sentir que ainda necessito mais de si? Pois, só sabemos o bem que temos... quando o perdemos.
Hoje, almocei com a sua Neta mais velha. Tem dois filhos e vive aqui perto de nós. Também vi o falei com o seu neto Fernando, o meu. Vi-o, na Alemanha, e ele viu-nos a nós. O meu neto Tomás está uma gracinha. Vimo-nos e falámos!!! Como? A Mãe nem imagina a volta que isto está dando. Não, já não é preciso esperar semanas pelos aerogramas que eu e o meu Irmão lhe mandávamos de África. "Isto agora é outra loiça". Penso que a Internet não será precisa aí no Céu, mas aqui é um desatino: sabe-se tudo, diz-se tudo, vê-se tudo, uma "fofoquice" pegada. Sim, Mãe, às vezes vê-se mesmo "tudo". Eu sei que a Mãe sempre detestou a "piada grossa", mas esta "escapou-me". Desculpe, sim?!
O JP era uma Criança, quando o viu pela última vez. Depois, cresceu e ficou ansioso de liberdade e de correr o Mundo. Cansou-se e agora, desde há pouco tempo, mora aqui, em frente a nós. Quem diria!!! Os caminhos de Deus são insondáveis. Dele e da Esposa vamos ter a Leonor. Pois, falta o Luís "o Príncipe", como lhe chamava a D. Alexandrina - quando a vir, por aí, dê-lhe um beijo meu. Pois o Luís também anda por aqui. Imagine que tem duas meninas RUIVAS. Um achado, na nossa Família. À Primeira, pensámos que era uma brincadeira dele e da Michelle. Quando veio a Segunda, demo-nos conta que era mesmo a sério. Também ruiva! Pronto, Mãe, eles não brincam em serviço. Saíram duas "coisas" lindas!
E nós, Mãe, eu e a Leo? Olhe, foi uma aposta ganha. Já vão 43 anos que juntámos os trapinhos - "dois gaiatos que não sabem o que fazem" - e que nos temos aguentado. Com solavancos, às vezes, mas agora temos a "certeza" de que um vai fechar os olhos do outro. Para ir ao seu encontro. "É a vida"! - como dizia um nosso 1º, ministro que a Mãe já não conheceu.
Olhe, Mãe, este ano lembrei-me das suas flores e enchi o jardim de sécias. Aí vão, pois sei que lhe vou dar alegria, mesmo que aí nada falte. Mas estas foram criadas por mim... para si. Olhe, vai ficar admirada, mas, em Setembro, não havia sécias na igreja de Aldeia, na festa de Nossa Senhora da Graça. Ou já ninguém as cultiva... ou aquilo "fia fino" - só flores de compra, das cara. Manias. Ou fartura de dinheiro. Tenho uma certeza: não foram cultivadas, colhidas e oferecidas a Nossa Senhora com aquele Amor que nós sabemos.
Ah! A casa!!! O Pai já lhe disse, com certeza, que o vosso grande sonho se realizou - ainda foi DELE! Por pouco tempo. Por isso, quisemos que ficasse para um de nós. É nossa. Está arranjadinha e confortável. É lá que nos abrigamos e pensamos em vós, quando vamos à nossa terra. Há-de ser de um dos vossos netos, se Deus quiser também.
Olhe, Mãe, eu não me cansava de ficar para aqui a escrever, a escrever. Mas Nosso Senhor pode ter-lhe dado alguma tarefa para cumprir e não quero que Se "aborreça" consigo...
Por hoje nada mais: dê saudades nossas a toda a Família aí presente. E às vizinhas. Um dia destes vou escrever sobre alguma delas. À Avó Emília mando um beijo muito especial. Ela sabe que não a esqueço. Já agora à tia Maria Zé também.
Para o Pai e para si eu mando mil beijinhos com saudades sem fim deste seu filho que nunca a esquece,
PS.
1. Não se esqueça de pedir a Nossa Senhora da Graça  e a Nosso Senhor que tenham pena deste pobre estroina, que se esquece, muitas vezes, daquilo que me ensinou com tanto Amor: REZAR E FAZER O BEM!!!
2. A Leonor nasceu, vai fazer 4 aninhos e tem agora um mano lindo, o Pedro. A Cristina casou e é muito feliz, o Francisco, seu neto afim, uma jóia. A maior parte das suas grandes amizades está já consigo.
3. Dos seus irmãos o que restava, o Fernando "Sarra" já o deve ter visto. Foi ter consigo no dia 13 de Junho, quando lembrávamos a morte da vossa mãe Emília, a nossa Avó.
4. Quando há coisas menos boas para dizer, olhe,  Mãe,"bico calado" para não sair asneira nem entrar mosca. Eu queria lá perturbar essa grande Felicidade de estar no Céu! Cá em baixo pensamos que nem era possível!
Beijo saudoso

1 comentário:

Luis disse...

Que bonito, meu pai.
Quanta saudade
Quanto carinho
Quanto amor

Quanto eu gostava que as minhas filhas me amassem assim como tu amas os teus pais e como eu amo os meus.
Como eu gostava que elas tivessem pelo pai a carinho e admiração que sinto por ti "paizão".

Deus me guie e me ajude a ser o pai para elas que tu sempre foste para mim.

Um abraço bem apertado

teu Luis